4 de julho de 2007

Achismo

Sem nada para fazer na minha hora de descanso, liguei a TV em um programa esportivo da Band (como se eles tivessem outra coisa; ou melhor, têm Gilberto Barros). Estava passando uma reportagem especial de um jogador da Portuguesa de São Paulo que havia admitido recentemente que era "gato", ou seja, um jogador que declara ser mais velho para tornar-se profissional e ganhar mais. Isso, a princípio, não é algo que se vê todo o dia. Um jogador fazendo mea culpa por causa disso, então, é coisa de dar mote até para um mini-documentário. Parecia ser este, com os devidos descontos, o viés da matéria.

O que me chamou foi o fato de o comentarista da Band, com um profundo ar de enfado, declarar categoricamente que não tinha pena nenhuma da criatura, e que pra ele a punição que o STJD iria dar ao jogador - 6 meses no mínimo - era pouco; pelo que fez, merecia era ser banido de vez do futebol.

Meus dois tostões sobre o assunto, como jornalista, admirador de futebol e ainda mais de jogador fazendo coisa que nenhum outro fez antes, como demonstrar um mínimo de inteligência (tirando uns e outros, como por exemplo Sócrates e, vez ou outra, Falcão):

- Jornalismo esportivo é o que se pode chamar de Império do Achismo. Quando é comentarista, então, o cara se reveste de uma aura de Deus supremo do futebol que nada abala, nem mancada dita em mesa redonda, embora provavelmente nunca tenha frequentado uma faculdade de Educação Física ou sequer conhecido o cotidiano de um clube. A opinião do tal comentarista da Band foi dispensável, para dizer o mínimo. Além do mais, ele não é nenhum juiz do STJD para proferir sentença contra jogador, clube ou o que valha (embora a idoneidade do tal tribunal possa ser questionada, mas isso são outros quinhentos), o que demonstra bem o nível de preparo de muitos "jornalistas" por aí;

- Independente do ato criminoso que levou o jogador perante a Justiça (e que deve invariavelmente levá-lo à punição), o tal comentarista, e mesmo o Tribunal, provavelmente desconhecem a realidade do futebol no Brasil, o que nos leva também a uma discussão sobre as próprias condições das famílias de baixa renda no país. Muitos pais levam os próprios filhos às seletivas de clubes declarando uma idade maior que a real, motivados por empresários ou diretorias inescrupulosas que visam apenas o lucro fácil com uma nova promessa. Pelo lado dos pais, o sucesso rápido dos filhos é a salvação para uma condição de miséria tal que não oferece uma opção mais ortodoxa, qual seja, os estudos, de perspectiva de futuro. Que se penalize quem faça tal coisa, certo. Mas também que se favoreça o futebol como parte integrante na construção de um cidadão, e não apenas como A salvação para problemas financeiros.

2 comentários:

negoailso disse...

concordo plenamente quanto ao fato de um jornalista proferir sentenças de direito ou pretender fazê-las com base em achismos.

mas o ponto em que me aparece uma dúvida é quanto fato do gato AUMENTAR a idade. Eu achava (desculpe-me por fechar contra o achismo e mandar, logo em seguida, um 'eu achava') que o gato era um esquema para DIMINUIR a idade dos jogadores, para que disputassem os campeonatos amadores com idade abaixo da pré-estabelecida. Inclusive, no caso do jogador da portuguesa, o "Fabiano Nascimento Carneiro, de 24 anos, que integrava o elenco profissional da Lusa, mas estava inscrito na Federação Paulista (FPF) como Jonas Tadeu Manuel de Oliveira, de 19 anos."

** entre aspas notícias em http://www.futnet.com.br/noticias/noticia.asp?C,,015308,3031-FN

Victor disse...

de fato, você tem razão. a errata está no post de cima.